Feijoada (quase) completa

Nada melhor do que chamar os amigos pra conversar, tomar uma bem gelada e se esbaldar de comida, de poesia e prosa, de música e melodia, de imagens e memórias, enfim, de amizade. Sem formas fixas, do jeito que a cabeça e a emoção pedir, da maneira que cada um prefere se expressar. Todos os amigos podem contribuir pra que essa feijoada deixe de ser "quase" e venha a ser completa. Um grande beijo nesta saudação inicial dos amigos José Neto e Anadora Andrade.

segunda-feira, 31 de julho de 2006

Engula!


Vá! Engula cada palavra escrita
toda paixão literariamente traduzida.
Engula!
Meta cada poesia por inteiro na boca!
E nem se atreva a mastigar meus sentimentos.
Eles são como bagaço de jaca:
só se saboreia e engole.
Depois, morre-se de indigestão.

Liana Lisboa

domingo, 30 de julho de 2006

Samba em fim de festa

Se confessei e até jurei
repousar-te no passado,
todo mundo jura um dia
bem ou mal dissimulado.

Das mentiras levo apenas
um teu beijo de lembrança,
faca cega corta o tempo
dentro do que foi distância.

Anadora Andrade e Tiago Groba

sexta-feira, 28 de julho de 2006

Abecedário do vocabulário seleto

Folheio um velho alfarrábio
Empoeirado que nem se lê
Meço estrelas em astrolábio
Só pra te amar a-bê-a-bê

Miro a lua pela calçada
Em noites que você não vê
Circunavego em jangada
Só pra te amar a-bê-a-bê

Bebo enguiço misturado com feitiço
Um e outro derramado no dendê
Não devolvo mais seu disco
Só pra te amar a-bê-a-bê

Ah, mas se soubesse yorubá
Meu amor não passaria de raspão
Atingiria direto o coração
Só pra te amar a-bê-bê-a

Tiago Groba

terça-feira, 25 de julho de 2006

Três declarações, estrofes, confusões

Tive certeza e pouco medo
seus olhos que não vejo
sua boca que não beijo
verdades sonhadas
estou toda enfeitada
e te espero.

São tão frios teus versos
me interesso
logo disperso
volto a imaginar
queria que lesse minhas linhas
ao despertar

Não sei até que ponto compreendes
a vontade imensa da sua língua
entre meus dentes.

Anadora Andrade

domingo, 23 de julho de 2006

EU versus


Vinha me faltando criatividade,
inspiração, algo mais e meu pouco talento.
E, pra piorar, ela me incitando.
Pirracenta.
Folha ousada de papel.

Peguei o lápis. Desisti.
Peguei a caneta.
Os traços da caneta não saem,
mesmo com corretivo você lê por detrás.

Percebi que queria feri-la
Feri-la.
Machucá-la, que é maior e ocupa mais espaço,
logo, fere, ops, machuca mais.

Engraçado ela não se manifestar.
Eu aqui, nervoso.
Ela impassível.
Sem mover-se nem com o vento forte da janela.
Desprezando minha tentativa silenciosa porém ativa de vingança.
Irritante.
Folha ousada de papel.

Outrora tivemos uma boa relação.
Afinal, no começo são tudo flores.
No nosso caso foram bons versos.
E ela veio com essa de provocar.
Eu sou maior mais forte,
domino a caneta, os meios de produção e o poder coercitivo
(mas) sou mais frágil se tiver que engolir sensações.

Então termino cedendo,
fingindo humildade, pedindo desculpas.
Percebo (derrotado) que ela fez de propósito.
Além do óbvio divertimento de me ver sofrendo,
é sempre bom a espera ter fim.
Mata meu tédio, meu dia inteiramente irritante de fim de domingo.
Ainda fico zangado, ranzinza, mas ela sabe ser assim.
Instigante.
Folha usada de papel.


J. F. Coelho Neto

sexta-feira, 21 de julho de 2006

Vício

Sua poesia já me consumiu três cigarros.
Também uma folha A4 inteira de sonetos mal feitos
Como um fraque esquecido no armário à espera
De que lhe encham os bolsos com
As mais bonitas palavras.
Mas pensando bem é assim mesmo: quando o coração
Não mais cabe numa folha, haverá outras em branco.
Basta entender esta complicada ferrovia
E pensar que tudo não passa de estações estações estações.
Em outros papéis, apesar de brancos, saias, varandas, tantas músicas
E correrias nas escadas ainda te esperam.
Esperam bocas que irão marcar feito carimbos passados
Em cartório situado na azul terra dos homens.
Esperam mares em ressaca onde o horizonte
Teima em se esconder, incorrigível.

Tiago Groba

quarta-feira, 19 de julho de 2006

Pós-amor

O coração não veio à boca
não me senti trapo nem roupa
mal reconheci sua voz.
Foi impossível sentir arrepio
aconteceu conforme a previsão
e não há quem faça voltar atrás
naquilo que é mais que desvio.

(...)

Não que eu sinta raiva,
tenho sim grande ódio
do tempo perdido com
cartas, calores, suspiros...

Anadora Andrade

segunda-feira, 17 de julho de 2006

Uma trilha no tempo

De ponto em ponto
em notas, cores, tons
de colorido desigual,
degrades rubros, verdes ardentes...
Copas de árvores, dias de sol...
meu copo vazio, o ventre em chamas... chama, reclama.

Impaciente a alma grita
peço - fique!
Alento o passo
firmo as duvidas, num pé de ajuda.
De ponto em ponto, nó que dei
em cores notas, os tons que me invadem...
sons, soam reluzentes agora...
brilho intenso de olhos luacheia.
Calma! O canto é largo, alcança rápido
chega até a soltar o espírito roto.

Enxuga meu rosto, me lava a vida,
Desperdiça, alinha meu traço
rasgo, fraco, torto, embaraçado...
Caio!
notas, cores, tons - Ó mí simpático!

Iara Canuto

domingo, 16 de julho de 2006


Diário

Houvera acordado praquilo?
Fazer meu dia e minha noite.
Esperar-me manhã impaciente
pra ligar ao meu pensamento.

Deixar-me esperar impaciente,
involuntária revanche,
para seqüência tão linda...

Trajar-se qual meados do século passado.
Doce clareza.
Doce leveza à francesa.
Boca sem sabor de canela.

Pra mesma boca sabor cenoura
e comida natureba,
o beijo ainda prazerosamente carnívoro.
Saída feminista independente
do meu tipo de (minha) mulher forte.

Da cansativa e irritante pausa pra obrigação
à controversos absurdos vinte minutos.
Eis que jogo os dois últimos versos janela afora
pra permitir pleno nosso momento.
Pra se fazer nossa porção imediata de mundo,
banhada da luz da sua lua.

Finda dia, não porção
(esta muito mais sólida)
do jeito seu inesperado.
Envergonhado, doce nada amargo.

Um sorriso, o seu.
O primeiro brilho que li desembaçado.
Aquelas palavras, soltas,
de pouca lógica
pros que dispensam devanear.
Saída cheia de graça,
numa corrida escorregadia
e não sei com que equilíbrio.

Que equilíbrio restaria
senão o riso louco solto
de cara e corpo e olho,
que, por falta de motivo,
há tanto não lembrava de dar.

Finda dia renovando o ciclo diário.
Renovado do pensamento viciado
ao corpo cansado.
E, pra mais do que rimar,
refaço a pergunta do verso abre alas.
Teria pra isso (tudo) acordado?
Obrigado.

Seu Neto(José)

sexta-feira, 14 de julho de 2006

Deliberação

A reunião da cúpula,
Copulada pela bancada governista,
Coerente com as prévias,
Informa aos seus correligionários,
Frente a coalizão
Dos radicais mais exaltados
Contra a base aliada,
O que mina estratégicos currais eleitorais,
Que ela foi adiada.

Tiago Groba

quinta-feira, 13 de julho de 2006

Manifesto em frente e verso

Pouca tinta na caneta
hoje escrevo a pincel,
procuro a cor mais bela na palheta
um tom azul bem sonho ido
só pra ter sempre comigo
essa esperança,
brincadeira de criança
que eu era e não passou

Sem forma e sem norma
proponho o delírio lírico
a idéia rimada
a estrofe esquartejada
em versos devaneios
pois meu bem
pra atingir-te a emoção
procuro meios

De escrever três ou vinte versos
a poeta não se cansa,
diz o que quer dizer
e a ti alcança.

Anadora Andrade

segunda-feira, 10 de julho de 2006

Hai K(ais)

Amargura só amor cura,
que esta poesia
não me atura.

Anadora Andrade

sábado, 8 de julho de 2006

mas então?
acabada a sedução,
a brincadeira...
tinha mais alguma coisa? eu esqueci?

mas então...
o amor, que coisa, né?
recomendo não...
mas fica à vontade.

Martim Silva

quinta-feira, 6 de julho de 2006


Quão triste aquele olhar.
Duramente silencioso.
Desoladamente cabisbaixo.
Pura expressão da melancolia.
No entanto, só realmente me incomodou
quando veio aquele suspiro.
Profunda tentativa de reanimar a alma
fazendo respirar as células desanimadas.

Seria somente o enfado do dia-a-dia;
da longa espera pelo ônibus.
O amor perdido num mundo
de impaciência, más coincidências,
escolhas que só tardiamente soube erradas.
A prestação da casa,
a morte do melhor amigo,
um litro quebrado da melhor cachaça.

Infindáveis razões para um infindável suspiro.
Mas que ficou com a partida do ônibus.

Agradeci sair dali.
Com menos ar nos pulmões.
Menos da minha atual palpável alegria.
E, além desses versos aqui desafogados,
mais das coisas que tentamos nos esquivar de pensar.


Neto(José)

quarta-feira, 5 de julho de 2006

Descaros

Amava como só os loucos ou tontos o fazem
Com todo amor que existia
Escrevia até nas mãos nascerem calos
amarelos e cheios de pus
grandes como suas mágoas.

Apenas um de nós
Seu reflexo no espelho.

Lágrimas não me dizem nada
Além do dito
Lágrimas comigo carrego
E daqui de dentro grito

Sua saliva vai se-can-do,
seu sexo perdendo o cheiro,
prazer que não passa de desespero.

Anadora Andrade

segunda-feira, 3 de julho de 2006

Confessei na noite mais calada
Pra que a voz da madrugada
Fosse testemunha ocular
Do que vim desabafar
E tal qual fiel mensageira
Espalhasse pela rua inteira
De manhã logo bem cedo
Quando a luz ainda tem medo
Que te amo pra mais da conta
Que assim chega amedronta
Pois não há esse no mundo
Que por amar feito vagabundo
Não se trema de pavor
Ao ver que nessa conta
Só se soma dor.

Tiago Groba

domingo, 2 de julho de 2006

Soneto da saudade


Eu, que tantas vezes, tive pensamentos,

junto a eles sofri em meus tormentos...
Ah! Hoje eu sofro por ti... também por mim!

capaz de pieguices numa rima chinfrim...

Hoje sofro o calor do peito, nada mais,
Saudades, memórias que não voltam atrás
O tempo que arde demais... no peito!

Braços teus, antes o meu leito. Bem feito!

Bem feito de mim, do que sobrou de eu

eu nego a gramática... não me vale nada...
Não me vale a cara, sem cara, o cara...

Parou! Acabou! É o fim! Meu Deus meu!
A quem recorro nessa hora triste, calada
A voz da racionalidade... tão rara! tão rara!

Vinícius Soares Carvalho